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Crítica The Post – A Guerra Secreta

The Post

Steven Spielberg é, sem dúvida, o diretor mais conhecido da era moderna e um dos mais influentes da história do cinema. Conhecido tanto por suas grandes aventuras como por seus poderosos dramas, Spielberg volta às telonas com o que é, sem dúvida, o filme mais oportuno do ano em The Post – A Guerra Secreta.

Indicado ao Oscar 2018 de Melhor Filme, o longa reconta um dos mais importantes episódios da história política norte-americana: a publicação dos famigerados “Papéis do Pentágono”, um estudo de mais de 7 mil páginas comissionado pelo Secretário de Segurança Robert McNamara detalhando a participação dos EUA na Guerra do Vietnã e as maquinações do governo (de Eisenhower à Nixon, passando por 4 presidentes) para esconder seu fracasso. Publicados inicialmente pelo jornal The New York Times em 1971, os documentos foram vazados na íntegra pelo The Washington Post causando um frenesi político no país, que já vivenciava uma queda na opinião pública sobre a guerra.

A história segue o repórter Ben Bagdikian (Bob Odenkirk), o editor Bem Bradlee (Tom Hanks), e Kay Graham (Meryl Streep), dona e publisher The Washington Post, detalhando a jornada da equipe para obter e publicar o documento. O longa é uma ode à era de ouro do jornalismo, exaltando a ética e o compromisso com a verdade que norteia os princípios da imprensa séria e seu papel de cuidadora do interesse público.

Aspectos técnicos

 

Fotografia

Comandada por Janusz Kaminski em sua 19a colaboração em 25 anos com Spielberg, a direção de fotografia é eficaz e direta. Baseada no cinza e nos tons pastéis do jornal impresso, o longa tem um visual que remete aos antigos filmes de espionagem e uma textura quase palpável.

Apesar do cenário limitado (o filme se passa quase inteiramente em ambientes internos como a redação do jornal e seus pequenos escritórios, salas e outros lugares fechados), a fotografia consegue manter as cenas dinâmicas e evitar o cansaço visual e psicológico, mantendo audiência engajada e casando de forma perfeita com o clima de suspense do roteiro. Não é o melhor trabalho de Kaminski, mas é certamente competente e admirável, haja vista que um diretor poderia falhar com as limitações de cenário.

Nota: 4

Trilha sonora

Novamente Spielberg mantém suas antigas parcerias e traz de volta o veterano John Williams para assinar a trilha, que cumpre seu propósito sem exageros ou menções memoráveis. Completamente orquestral, música e fotografia mesclam bem sem que a primeira tome a vanguarda da cena, mas conseguem deixar o espectador inquieto e cheio de expectativa.

Nota: 3,5

Elenco

Com um time fortíssimo e nomes expressivos tanto entre os protagonistas quanto nos coadjuvantes, espanta que The Post – A Guerra Secreta tenha conseguido apenas duas indicações ao Oscar. Encabeçado por Meryl Streep (novamente indicada na categoria de Melhor Atriz) e Tom Hanks (em sua quinta vez ao comando de Spielberg), o elenco conta ainda com Bob Odenkirk, Sarah Paulson, Matthew Rhys, Alison Brie, Bradley Whitford, e Bruce Greenwood em papéis importantes. Hanks está ótimo em seu papel e as cenas entre ele e Streep são um deleite para qualquer cinéfilo.

Maravilhosa como sempre, Streep rouba a cena com sua Kay Graham de determinação contida e calma cultivada durante anos como a única mulher em meio a uma sala cheia de homens. O crescimento da personagem é notável, começando por sua primeira cena em que aparece frágil e insegura diante de uma reunião financeira, até a mulher determinada e disposta a impor sua vontade, culminando em uma linda cena em que a Sra. Graham desce os degraus da Suprema Corte americana em meio a um corredor de secretárias que a olham com admiração para logo em seguida voltar a um escritório cheio de homens desconfiados. Vale destacar outra cena incrível da atriz, em que Graham confronta o Secretário de Segurança McNamara (seu amigo de longa data) e discorre sobre seu dever para com a verdade e o público.

Bob Odenkirk também brilha como o herói por trás das câmeras – seu Ben Bagdikian converte para a tela toda a determinação e caráter de um profissional que lutou com unhas e dentes para trazer à tona algo que sabia ser decisivo para o curso de seu país (e de sua profissão).

Nota: 5

Roteiro

É quase um milagre que a estreante Liz Hannah tenha conseguido produzir o roteiro mais relevante de 2017. A narrativa discorre de maneira oportuna sobre o momento político atual dos EUA a partir de uma história verídica de 40 anos atrás. Com as acusações sobre fake news lançadas pelo governo Trump à imprensa americana e a consequente guerra midiática que se instalou e se espalhou pelo globo, além da recente tentativa do presidente americano de censurar um livro do jornalista Michael Wolff sobre sua administração, uma história sobre a importância da liberdade de imprensa é extremamente significativa.

Mesmo assim, o roteiro é esperto de maneira a comtemplar de forma sutil ainda outro tema atual: o feminismo. Fã de Kay Graham (cuja biografia ganhou o Pulitzer em 1997), Hannah mascara o enredo sobre o machismo sofrido por sua heroína sob uma ótica mais popular e confortável para o público, que continua vivendo numa realidade não tão diferente. A luta de Graham para se firmar numa posição de poder em plena década de 1970 é uma narrativa contemporânea importante que tem permeado Hollywood nos últimos dois anos, especialmente após as denúncias contra o megaprodutor Harvey Weinstein e o surgimento do movimento Me Too e Time’s Up afim de combater a cultura do estupro e a desigualdade de salários para mulheres.

Ademais, o roteiro é bem espaçado e tem ótimos momentos, transformando o enredo numa história de suspense e espionagem, que também possui seus momentos de descontração e comédia sem comprometer as partes mais sérias. A maior falha de The Post, que talvez recaia tanto sobre a direção quanto sobre o roteiro, é o exagero dramático. Por vezes, cenas de alto impacto passam do ponto e entram no território do melodrama, transformando momentos importantes em uma novela de seis, o que não atrapalha no impacto final do filme, mas pode incomodar a audiência em certos momentos. O longa fecha numa nota alta, com uma cena hilária que ressalta a importância histórica do evento e seu impacto no futuro do jornalismo político.

Nota: 4,5

Spielberg entrega mais uma vez um filme impactante e atual, com ótimas atuações de atores consagrados. Com uma narrativa certeira que não se arrasta demais e nem se prende num aspecto único do tema, The Post – A Guerra Secreta é uma ótima pedida.

Notal Geral: 4,2

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