Por Renata Schmidt
Peças falam de transtornos mentais de dentro pra fora, sob perspectivas feminina e masculina
“Uma vocação desperdiçada é morrer em vida”. A frase, escrita pelo dramaturgo Fernando Aveiro para o monólogo “Hospedeira”, descreve com exatidão a performance de Johana Albuquerque na pele de Carmen, personagem esquizofrênica escolhida pela diretora e produtora para voltar aos palcos como atriz após 15 anos trabalhando nos bastidores. A vocação de Johana para a atuação, manifestada a cada inflexão de voz e transfiguração de olhar, é evidente demais para não ser dividida com o grande público.
O monólogo é uma aposta ousada para um retorno aos palcos, afinal, nem o melhor texto do mundo é capaz de salvar o espectador que se depara com uma performance forçada (ou, pior ainda, desanimada). Johana, entretanto, dá conta do recado com os mesmos talento e força que manifesta em seus trabalhos como diretora, guiando os expectadores com segurança à flutuação entre o riso e as lágrimas experimentada por sua protagonista, cuja doença faz oscilar entre uma realidade sombria e um delírio megalomaníaco e nostálgico marcado por Frank Sinatra e máquinas de escrever.
Se em “Hospedeira” temos uma atmosfera na qual predomina a histeria feminina, em “Paquiderme”, segundo monólogo da noite, deparamo-nos com traços da neurose obsessiva classicamente atribuída à personalidade masculina. A peça, de autoria de Daniel Farias (e direção da própria Johana), é visceralmente interpretada por Daniel Alvim, que entra na pele de um indivíduo atormentado pelas feridas de suas mãos e de sua alma, que enfrenta a ambiguidade entre o desejo e a obrigação ao mesmo tempo no qual disseca sua trajetória em busca de explicações para um crime. A peça assusta e encanta, já que é impossível não sentir nossas próprias angústias naquelas refletidas no palco.
Os monólogos ficam em cartaz no Centro Compartilhado de Criação até o dia 12 de dezembro, podendo ser assistidos juntos, na sequência, ou separadamente.
Serviço
Hospedeira & Paquiderme: Díptico de Estranhas e Esquizos Dramaturgias Contemporâneas – Reestreia em 6 de novembro, segunda-feira, às 20 horas, no Centro Compartilhado de Criação.
Temporada: Até 12 de dezembro.
Segundas: Paquiderme, às 20 horas e Hospedeira, às 21h30.
Terças: Hospedeira, às 20 horas e Paquiderme, às 21h30.
Recomendado para maiores de 14 anos. Ingressos: Para ver uma peça paga-se R$ 30,00 (inteira) ou R$ 15,00 (meia-entrada). Quem for ver os dois espetáculos no mesmo dia, paga R$ 40,00 (inteira) ou R$ 20,00 (meia-entrada). Ingressos à venda na bilheteria do CCC ou pelo site: https://www.sympla.com.br/centrocompartilhadodecriacao