Por: Renata Schmidt
Confira a entrevista exclusiva de Andreas Kisser para o E.T.C
Machine Messiah, último álbum de estúdio do Sepultura, é um dos lançamentos mais poderosos no cenário do heavy metal de 2017, tendo obtido o status de clássico pelos fãs da banda. Tivemos a oportunidade entrevistar Andreas Kisser, guitarrista, na véspera do último show do ano da banda em São Paulo. Confira a seguir o bate papo, em que o músico expressa sua opinião sobre as redes sociais, a passagem do tempo e, é claro, Rock n’Roll.
E.T.C. Um dos temas centrais de Machine Messiah é a obsessão das pessoas por redes sociais e, paralelamente, a sensação de despersonalização causada pela vida virtual. Paralelamente, ouvimos falar de bandas que explodiram através de sua divulgação maciça em social media. Tendo isso em vista, como vocês avaliam o impacto dessas redes no cenário do metal?
A.K. Mano…acredito que a questão central do Machine Messiah não é exatamente colocar as redes sociais como algo totalmente errado, e sim mostrar o papel central da disciplina para impedir o desequilíbrio. É como quando você tem um filho, que precisa ir para a escola, fazer a lição de casa, ir jogar bola na rua e só depois jogar videogame, saca?
Com a gente também funciona assim, muitas pessoas já têm o hábito de deixar o celular em um canto da casa após determinado horário, para curtirem as outras pessoas. Maasss…tem também uma galera com o hábito de baixar apps pra tudo. Nessa pegada exagerada as pessoas acabam perdendo o contato visual, não vão mais pro boteco com a galera…tipo quando você chega no bar e vê um monte de gente, cada uma olhando pra sua tela, sabe? O álbum evoca essa preocupação de perda do desenvolvimento do intelecto, tem tanta energia e tanta coisa no universo com que podemos ter uma conexão, que acabamos perdendo por ficar olhando o dia todo para uma tela de celular…nesse sentido, a robótica age como um impedimento em nosso desenvolvimento intelectual e na busca de equilíbrio.
É claro, há inúmeros aspectos positivos do desenvolvimento tecnológico, tanto no aspecto médico, com o surgimento de próteses que substituem partes do corpo, por exemplo, quanto no próprio aspecto musical, a divulgação das bandas pela internet revolucionou esse tipo de mercado, tanto que não se vendem mais discos como antigamente. Hoje as pessoas podem fazer clipes em suas próprias casas, usando criatividade, e ter sucesso independentemente de saírem na TV, no final o que acaba valendo mesmo é o conteúdo.
E.T.C. Você acredita que se o Sepultura fosse criado hoje, seria muito diferente do Sepultura de 1984, em termos de som e da banda em si?
A.K. Nossa, essa é uma pergunta difícil, hahaha….acho que o som poderia sim ser diferente, a atitude não. A perseverança, o profissionalismo de ensaiar todos os dias, bater cartão, estudar um instrumento, isso seria exatamente igual hoje ou há 20, 30 anos. As consequências de hoje no som em si eu realmente não saberia prever, talvez o sucesso fosse maior, talvez o sucesso fosse mais rápido, ou não, rs. O mais importante é que sempre tivemos essa seriedade, a visão do Rock’n Roll como profissão, e não como aquela visão estereotipada de ter uma banda para ir em muitas festas e pegar mulher.
E.T.C. Trata-se do segundo álbum com o Eloy Casagrande, que tem 26 anos (praticamente o tempo de Sepultura do Derek, rs). Essa diferença geracional contribui para enriquecer o som de vocês?
A.K. Nossa, não é o terceiro? Pera, não, é o segundo mesmo, hahaha…então, idade é uma coisa muito relativa, cara, e o Eloy é um cara que começou muito cedo na música, com 7, 8 anos. Lá pelos 12 ou 13 anos ele já tinha um prêmio mundial de bateria, o Modern Drummer’s Undiscovered. A base musical dele é completíssima, trouxe muitas possibilidades e uma energia ótima, o que é essencial se você pensar que vivemos juntos na estrada, eu passo mais tempo com a minha banda em turnê do que com a minha família! Nossa química funciona muito bem!
E.T.C. Machine Messiah é um dos álbuns mais suaves de vocês, principalmente pelo uso de violões e violinos em algumas faixas, de onde veio a inspiração para essa pegada diferente?
A.K. Olha, eu não chamaria o álbum de suave, os violinos não deixam necessariamente o som mais leve…as letras são bastante densas, a voz do Derrick é bastante grave. Eu diria que temos um álbum mais melodioso, bastante técnico. O intuito foi criarmos um álbum o mais musical possível. Ouvimos muito das pessoas que escutaram o disco o termo prog, de progressivo, e realmente para perceber alguma influência desse tipo de som, até porque gosto muito de Yes, Pink Floyd, então faz sentido haver algo de progressivo no som. Acho que o mais bacana é que Machine Messiah traz algo de novo à música do Sepultura, da mesma forma que o Roots em 1996.
E.T.C. Com a enxurrada de bandas estrangeiras vindo ao Brasil nos últimos 5 anos, as bandas nacionais de metal tendem a ficar relegadas ao segundo plano. Vocês teriam alguma indicação de som brazuca pesado para nossos leitores?
A.K. Na minha visão o cenário do metal está bastante fértil hoje em dia, mesmo que não seja algo muito divulgado no dia a dia pela grande mídia, que não dá muito espaço para esse tipo de música. Hoje, tenho um programa com meu filho na Rádio 89, de domingo à noite, nele 80% da programação é dedicada ao metal nacional, e temos o privilégio de trazer bandas para darem entrevistas e tocarem no programa, algo que não é muito comum hoje em dia.
A grande sacada do Heavy Metal é que sua passagem de uma pessoa pra outra se dá em uma escala muito mais familiar do que via mídia, mesmo, sempre foi assim! É algo que passei para o meu filho, que tem aumentado sua coleção de vinis, que recebi de meu vizinho, que me gravava umas fitas, é uma coisa extremamente real e atemporal, não depende de moda, não depende de rádio, TV, é uma herança que vem de berço, e que vai muito além do Brasil…com o Sepultura, tivemos a oportunidade de presenciar isso de perto, já passamos por 76 países, como África do Sul, Indonésia, Israel, Estados Unidos, onde deu pra sentir bem essa cultura do metal.
E.T.C. Amanhã é o último show da turnê. Animado?
A.K. Pô, eu sou da Zona Leste, é muito legal poder voltar pra Mooca, principalmente no Juventus, onde fui quando era moleque assistir alguns shows, como dos Paralamas…São Paulo é um mundo em si, e temos a oportunidade de tocar em partes diferentes da cidade para alcançar aquelas pessoas que não saem de uma região para ir num show em outra! Cara, claro que o show vai ter muitas músicas do Machine Messiah, mas terão também muitos clássicos do Sepultura! Esperamos todo mundo lá.