Banda do Rio de Janeiro mistura ritmos e diferentes manifestações artísticas para criar, debater questões sociais e explorar e incentivar a arte
Conforme o título da matéria já sugere, a Overdrive Saravá é uma banda diferente de tudo que já tivemos o prazer de conhecer em nossas entrevistas até agora. Infelizmente, porém, a conversa com essa galera talentosa, criativa e de imensa vontade de auto superação, foi somente online; mas, de forma alguma, ela deixou de ser fruto de ótimas surpresas e histórias belas de pessoas que fazem o que amam.
A banda surgiu em 2012 após dois integrantes flertarem com o nome “Overdrive Saravá” que vem do nome do efeito de distorção encontrado nos pedais de guitarra (Overdrive) e na saudação relacionada às culturas afrodescendentes da umbanda e do candomblé (Saravá).
Com a ideia fixa do nome, mas sem saber exatamente o que viria a partir disso, os dois chamaram o vocalista, Gregory Combat (com quem conversamos), para descobrirem juntos o leque de possibilidades que poderiam explorar com o nome do projeto. “Temos um orgulho muito forte do nome por conta do que ele causa na gente. Não é à toa que diversas pessoas que passaram pelo projeto – e deixaram um pouco de si – ficaram com uma sensação de pertencimento”, diz Gregory.
E foi exatamente a partir – e por causa – do nome que a identidade da banda se tornou tão poderosa. Apesar de no início eles não saberem exatamente o que viria em decorrência do nome, eles sabiam que queriam quebrar convenções do que é conhecido, e já tinha sido trabalhado por eles em projetos anteriores, como banda de rock.
Misturando não só diversas vertentes artísticas para suas performances e não só os ritmos de todo o Brasil para dentro do rock, a Overdrive Saravá ainda trata de assuntos de extrema importância em âmbito social, econômico e cultural que afetam a vida e o convívio das pessoas em sociedade. “Sofremos muitas influências de outras linguagens artísticas. E vivendo em um contexto político, social, econômico tão divergente, a gente lidava – e lida – com essas questões de uma forma muito presente. Sempre debatíamos essas coisas na universidade e levávamos para o espaço público através de manifestações artísticas, não só musicais”, explica.
“Nós todos participamos de algum movimento que discute e debate temas econômicos, sociais e culturais. Então, esse debate não poderia ser diferente na música. Acreditar no poder da transformação pela arte e pela cultura é algo muito forte para gente. Poder compor, criar e se manifestar através desses temas, não é só um processo criativo que nos é legítimo, como também a importância de dialogar e trazer as pessoas para esse campo de debates”.
Essa imersão dos integrantes da banda nos meios sociais e culturais, também se dá ao fato de não serem somente músicos mas, sim, estarem envolvidos em outros campos da arte. O vocalista, Gregory (28), por exemplo, também é do teatro e atualmente tem um projeto com circo. Além dele, os guitarristas Lucas Botti (26) e Thiago Henud (29), e o baixista, Matheus Freire (26), são de arquitetura, portanto, têm a veia do desenho muito forte em suas vidas e carreiras. Todas essas referências auxiliaram no processo criativo deles e na inserção de outras manifestações culturais em sua própria.
Muitas dessas inserções são feitas por meio de parcerias com outras pessoas, grupos e movimentos. Uma delas foi com um grupo de capoeira que fez a abertura do primeiro show da banda. “A gente acha que a arte é plural, que ela transborda por diferentes caminhos e expressões e continuaremos trazendo isso sempre”, completa Gregory.
O DISCO
O primeiro disco da banda foi lançado esse ano com oito faixas que trazem todos esses elementos citados acima. A mistura e a incorporação de diferentes ritmos tradicionais brasileiros dão o toque e o diferencial do CD. “Nós estivemos com grupos de maracatu, de jongo, fomos estudar baião, xote, etc. Essa mistura, essa pluralidade do disso que vem também da bagagem de cada um dos integrantes, de um cruzamento de referências e de muitas interferências que cada um sente, o que cada um vive e o que cada um quer passar dentro desse projeto que é o Overdrive Saravá”, diz.
A pré-produção do disco foi feita em um sítio isolado em Teresópolis que, segundo o vocalista, foi um dos momentos mais marcantes da produção por estarem cercados de natureza, podendo focar inteiramente naquilo que eles queriam fazer e depositando todo o melhor deles – em meio ao furacão de referências e ideias – dentro desse trabalho.
O disco tem produção de Renan Carriço (atual baterista da banda), mixagem de Martin Scian, e masterização de Matheus Gomes. A escultura presente na capa é uma obra feita exclusivamente para eles do artista plástico Ciro Najar, com fotografia de João Pacca e direção de arte do Estúdio Cru.
ATABAQUES E D’JEMBES
A banda lançou em agosto desse ano o seu primeiro vídeo clipe. “Atabaques e D’jembes” tem um som forte com um material audiovisual ainda mais gritante em se tratando dos conceitos ali passados.
Gregory conta que a partir do momento em que eles escolheram a música, começaram a pensar na urgência que sentem em trabalhar com performances. Com isso, surgiu o personagem do ator Vinícius Andrade que é um marginal aos olhos da sociedade, que se empodera e começa a protagonizar a própria história. “O Vinícius já vem de um processo de militância negra LGBT, então ele traz uma representatividade muito importante para o personagem. O clipe foi muito mais performático no ponto de vista de que jogamos ele na Lapa só com a ideia inicial. E foi a partir do momento em que ele caiu no mundo completamente empoderado que ele deu voz ao corpo, à mente e as ações”, completa.
2017
Com show de lançamento do disco previsto para o começo do ano, a banda planeja um espetáculo envolvendo toda a sua corrente criativa de forma muito mais pensada e em conjunto com as músicas do disco.
Além disso, acreditando no poder do audiovisual na música, eles pretendem lançar mais dois ou três clipes ao longo do ano. “Tudo depende de como vão fluir os novos processos da banda”, finaliza Gregory.
“Nós prezamos muito pela troca de olhares, de afeto através da arte. Em um mundo onde o discurso de ódio é preponderante, essa aproximação através da cultura e da arte é muito importante”.