Resenha Crítica – Antes Que Eu Me Esqueça

Por Jaqueline Oliveira

“Feridas abertas são ótimas para a arte” é, com certeza, a frase que mais marca o filme. Sendo o caminho por onde o longa percorre, a frase dá luz ao tema central da trama e carrega a emoção passada na comédia dramática. “Antes Que Eu Me Esqueça” trata justamente disso: apresenta uma realidade que é tão corriqueira, mas de forma poética, fazendo das feridas e dores, ferramentas para a composição de uma obra de arte. Ao relacionar a música neste contexto, a trama segue para algo mais profundo ainda, mesmo que, em conjunto, apresente a superficialidade da comédia, linha tênue durante longa, que alivia o peso dramático.

A realidade corriqueira é mostrada com a história de Polidoro (José de Abreu), que aos 80 anos é um juiz aposentado, que vive sozinho e decide investir seus fundos numa boate de stiptease, em Copacabana. Sem contato com o filho Paulo (Danton Mello), um pianista fracassado, Polidoro acaba sendo alvo de uma ação judicial, quando sua filha mais próxima, Bia (Letícia Isnard), busca recursos na justiça para interditá-lo, com receio de o pai passar muito tempo sozinho.

FOTO: Cena do filme ‘Antes Que Eu Me Esqueça’/Divulgação

A partir de então, a história se desenvolve na equação de Paulo ter que, por obrigação judicial, passar mais tempo com o pai, que está totalmente envolto em seu novo projeto da boate de striptease, sob a fiscalização da promotora Maria Pia (Mariana Lima), para que assim haja uma decisão mais concisa sobre o caso, e não apenas a opinião de um dos filhos. Com os personagens secundários, como as funcionárias da boate, os amigos idosos de Polidoro (com a participação de Dedé Santana),  a promotora do caso, Maria Pia (que acaba se envolvendo muito mais no drama familiar), e o amigo e confidente musical de Paulo, o pianista David (Augusto Madeira) – o responsável por dar voz a frase inspiradora do início do texto – , acabam fazendo destas relações peculiares, um misto de amizade, respeito e carinho, acima de qualquer diferença, levando para a tal realidade, a poesia da vida em seus aspectos mais simples e genuínos.

Nesta cenário, o longa levanta um debate delicado que faz com que a realidade fique ainda mais evidente no tema do filme: o modo como os filhos rejeitam os pais quando estes atingem uma idade avançada e, geralmente acabam sendo esquecidos na solidão da velhice. Carregando ainda mais o peso dramático, não para por aí, Polidoro também começa a desenvolver o Alzheimer. No meio de tudo isso, Paulo tenta se superar no piano, que acaba o fazendo tomar decisões que envolvem o pai e seu histórico familiar com ele – razões que causaram o distanciamento entre os dois. O filme é recheado e cenas emotivas sobre as relações familiares. Dirigido por Tiago Arakilian e com roteiro de Luisa Parnes, a produção executiva fica a cargo de Carlos Saldanha, diretor brasileiro que foi indicado ao Oscar por “Touro Ferdinando” e que está por trás das animações “A Era do Gelo” e “Rio”.

FOTO: Cena do filme ‘Antes Que Eu Me Esqueça’/Divulgação

“Antes Que Eu Me Esqueça” é bom?

O filme encontra um equilíbrio entre o apelo popular e assinatura autoral, com detalhes que tornam o humor a base para a estrutura total da trama. É inevitável a referência às famosas chanchadas, com piadas de duplo sentido e com a defesa do sexo como uma necessidade básica do ser humano, numa realidade tão absolutamente fatídica e, ao mesmo tempo, normal, num tom que também lembra as comédias românticas francesas. Num formato que funciona (e muito!), principalmente pelo resgate de características cinematográficas de uma tradição cultural que há um tempo não estava em cartaz, sendo nacional.

A fotografia é caracterizada por um conjunto de situações que lembram o cotidiano brasileiro, muito bem representada em cenas onde se encontram senhores conversando e jogando nas pracinhas das cidades, neste caso, em Copacabana, Rio de Janeiro. De certa forma, a fotografia garantiu também a não invasão cinematográfica de uma intimidade do cenário, do ambiente, no quesito de apresentar estas situações de forma agradável e real, além de muito conhecida pelo público, sem delongas ou pausas autoexplicativas. Já a trilha sonora ficou responsável pela composição do filme por ser a protagonista sonora da emoção que o roteiro desejava passar. Inclusive, em uma das cenas (algo que remetia ao desespero), a música teve um de seus melhores destaques, ao ser aumentada e posta de forma a causar o incômodo apresentado pelos personagens.

Em alguns momentos, o filme teve erros de sequência, com problemas de imagem (numa das cenas foi utilizada a câmera tremida – sem nenhum sentido), erros de figurinos (com possibilidade de ver a base do microfone), mas detalhes que não conseguiram tirar toda a magia e emoção do filme. Outro ponto negativo, é que, de alguma forma, os personagens se encaixavam com os atores, mas o próprio elenco não teve conexão. Em alguns momentos, não havia química entre os atores e isso pesou em uma das principais cenas (quando a família se reúne no tribunal para ouvir a sentença do juiz quanto ao estado de Polidoro), que acabou gerando desconforto emocional ao assistir: a emoção vinha, mas desparecia, tentava mais uma vez e ia embora novamente. No mais, o filme mostrou para que veio e conseguiu captar a essência de um roteiro belo, ao apresentar uma realidade tão cotidiana.

O E.T.C. foi à cabine/coletiva de imprensa no dia 15 de maio e o filme terá lançamento oficial dia 24 de maio de 2018. Confira o trailer e, abaixo, a ficha técnica!

Ficha Técnica

Título original: Antes Que Eu Me Esqueça

Gênero: Comédia Drama

Ano de produção: 2017

Estréia: 24 de maio de 2018

DireçãoTiago Arakilian

Produção executiva: Carlos Saldanha

Roteiro: Luisa Parnes

Elenco: Danton Mello; José de Abreu; Mariana Lima; Augusto Madeira; Letícia Isnard; Guta Stresser; Eucir de Souza; Saulo Rodrigues; Silvio Matos; Dedé Santana; Kathia Calil; Miguel Nader; Luiz Magnelli; Aisha Jambo; Bruno Debaux; Cora Zobaran; Claire Digonn e Eder Paolozzi.

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Post Author: Jaqueline Oliveira

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